Déficit em Julho: Ampliação do Bolsa Família e Queda nas Receitas com Estatais Impactam Resultado

No último dia 30, o Tesouro Nacional divulgou que o governo central apresentou um déficit primário de R$ 35,93 bilhões em julho, marcando o segundo pior resultado para este mês desde o início da série histórica em 1997, considerando a correção pela inflação.

Este cenário econômico desafiador, segundo especialistas consultados pela CNN, é o reflexo de diversos fatores, tais como a expansão dos gastos com o Bolsa Família decorrente da PEC do Estouro, a queda das receitas provenientes de estatais e a aplicação de uma política monetária contracionista nos últimos meses.

Comparando julho deste ano com o mesmo mês do ano anterior, observou-se uma queda real de 5,3% nas receitas líquidas, enquanto as despesas apresentaram um crescimento de 31,3%. O economista-chefe e sócio da corretora Warren Rena, Felipe Salto, salienta que o déficit está em conformidade com as expectativas para o período, e projeta que o déficit para o ano de 2023 deve atingir cerca de R$ 114 bilhões. No acumulado de janeiro a julho, o governo central já acumula um déficit primário de R$ 78 bilhões.

Para compreender a origem das despesas que contribuíram para esse cenário, o economista e especialista em contas públicas, Murilo Viana, aponta para a PEC do Estouro, que abriu espaço orçamentário permitindo a expansão dos gastos com o Bolsa Família e outros programas sociais. Em julho, os gastos com programas sociais aumentaram em R$ 6,5 bilhões, ajustados pela inflação, em comparação com o mesmo mês do ano anterior.

No que diz respeito à queda na arrecadação, Viana destaca a desaceleração da atividade econômica no país, que, em parte, está relacionada à política monetária contracionista adotada pelo Banco Central. “Devemos lembrar que o efeito da política monetária é defasado, e ao longo do ano passado e início deste ano, as taxas de juros permaneceram elevadas”, explica Viana. “Além disso, apesar do início do ciclo de redução das taxas de juros, a taxa real de juros permanece alta, o que inibe o crédito e desencoraja os investimentos produtivos”, acrescenta.

O calendário também influenciou o déficit, com uma redução nos pagamentos de dividendos e juros sobre o capital próprio por parte das estatais, resultando em uma queda de R$ 5,4 bilhões, corrigidos pela inflação. O Tesouro Nacional explicou que essa variação ocorreu porque, no ano anterior, a Petrobras distribuiu dividendos em julho, enquanto este ano a distribuição ocorreu em agosto, o que será refletido no próximo relatório a ser divulgado em setembro.

Outra contribuição para o déficit veio da redução das receitas de royalties, que diminuíram em R$ 5,74 bilhões em comparação com julho de 2022, devido à variação no preço internacional do barril de petróleo, que agora se situa em torno de US$ 84, após ter alcançado US$ 120 no mesmo período do ano anterior.

Apesar do cenário desafiador em 2023, o governo federal estabeleceu a meta de déficit primário zero em seu Orçamento para 2024, ou seja, equilibrar as despesas com as receitas. Murilo Viana destaca que o resultado de julho gera preocupações adicionais sobre a capacidade do Ministério da Fazenda em atingir essa meta, visto que as expectativas do mercado não estão ancoradas, com agentes projetando um déficit em torno de 0,8% do PIB para 2024.

Felipe Salto ressalta que a nova regra fiscal prevê a possibilidade de rompimento da meta de resultado primário, mas, caso isso ocorra, o governo precisará limitar, no ano seguinte, o crescimento das despesas a 50% do crescimento das receitas. “É fundamental que o governo mantenha seu compromisso com a meta fiscal atual, evitando qualquer alteração que abriria espaço para gastos adicionais, como proposto por parte do Congresso”, adverte Salto. Murilo Viana concorda e enfatiza que é mais sensato ter um déficit do que recorrer a manobras contábeis questionáveis.

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