Miguel Gutierrez e Anna Saicali são alvos de mandados de prisão preventiva e deixaram o país; defesa alega inocência.
A Polícia Federal incluiu o ex-CEO das Lojas Americanas, Miguel Gutierrez, e a ex-executiva Anna Saicali na difusão vermelha da Interpol, após ambos serem alvos de mandados de prisão preventiva. A medida busca garantir que os dois sejam detidos caso se desloquem para qualquer um dos países membros da Interpol. Eles são investigados pelo rombo de R$ 25,2 bilhões na varejista.
A difusão vermelha é um mecanismo utilizado para publicizar ordens de prisão internacionalmente, permitindo que as autoridades dos países integrantes da Interpol possam cumprir o mandado. Gutierrez e Saicali deixaram o Brasil antes da emissão dos mandados, com Gutierrez saindo em 29 de junho de 2023, logo após a instauração do inquérito pela PF e a criação de uma CPI sobre o tema no Congresso. Ele possui dupla nacionalidade, brasileira e espanhola.
Enquanto a assessoria de Saicali não se pronunciou, a defesa de Gutierrez declarou que “não teve acesso aos autos das medidas cautelares” e que “não tem o que comentar”. Os advogados afirmam que “Miguel reitera que jamais participou ou teve conhecimento de qualquer fraude e que vem colaborando com as autoridades, prestando os esclarecimentos devidos nos foros próprios.”
A investigação revela que Gutierrez vendeu R$ 158 milhões em ações da Americanas após ser informado de que seria substituído no comando e que as irregularidades financeiras seriam descobertas. No total, 11 ex-executivos da empresa venderam mais de R$ 250 milhões em ações após a comunicação da troca de liderança, ocorrida em julho de 2022, quando Sergio Rial foi anunciado como novo CEO.
Os dados coletados mostram que essas vendas foram realizadas com base em informações privilegiadas, caracterizando crime de uso de informação não divulgada ao mercado para obter vantagem financeira. A PF aponta que Gutierrez, sabendo que as ações se desvalorizariam com a revelação das fraudes, vendeu suas ações a um preço superior antes que o mercado tomasse conhecimento dos problemas.
Além de Gutierrez, Anna Saicali vendeu R$ 57 milhões em ações a partir de julho de 2022. Outros executivos também realizaram vendas significativas, como José Timotheo de Barros (R$ 20,2 milhões) e Márcio Cruz Meirelles (R$ 5,5 milhões), entre outros.
A operação “Disclosure” da PF, que visa dar transparência à situação econômica da Americanas, mobilizou cerca de 80 policiais para cumprir dois mandados de prisão preventiva e 15 de busca e apreensão no Rio de Janeiro. A Justiça Federal também determinou o sequestro de bens e valores dos ex-diretores, totalizando mais de R$ 500 milhões.
A investigação é fundamentada em acordos de colaboração premiada com ex-diretores da empresa, Marcelo Nunes e Flávia Carneiro, que revelaram que as fraudes tinham como objetivo atingir metas financeiras internas e garantir bonificações. Essas práticas aumentavam ilicitamente o valor de mercado das ações da Americanas.
Os crimes investigados incluem manipulação de mercado, uso de informação privilegiada e associação criminosa, com penas que podem chegar a até 26 anos de prisão. As medidas da operação foram autorizadas pela 10ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro.
O escândalo financeiro na Americanas veio à tona no início de 2023, quando a empresa divulgou inconsistências contábeis superiores a R$ 20 bilhões, levando à recuperação judicial. Estudos internos confirmaram que essas inconsistências eram, de fato, fraudes contábeis praticadas por ex-funcionários.
Em novembro de 2023, ao adiar pela quarta vez a divulgação das demonstrações financeiras de 2022 e a revisão do balanço de 2021, a Americanas informou à CVM que foi “vítima de uma fraude sofisticada e muito bem arquitetada, o que tornou a compilação e análise de suas demonstrações financeiras históricas uma tarefa extremamente desafiadora e complexa”.